A ser verdade que algumas grande empresas da indústria química norte-americana têm feitos tremendos lobbies e "comprado" agentes políticos no sentido de se autopreservarem e manterem o status quo dos combustíveis fósseis (desacreditando o aquecimento global), bem como os seus ativos e planos estratégicos, enquanto engenheiros químicos devemos ser os primeiros a repudiar tais atos: no artigo 86º do código deontológico da Ordem dos Engenheiros, referente a Deveres do engenheiro para com a comunidade, diz o ponto segundo: O engenheiro deve defender o ambiente e os recursos naturais.
A este respeito, é de destacar o modo como a Shell, cuja atividade principal está historicamente ligada aos combustíveis fósseis, recentemente surpreendeu a sociedade civil ao colocar-se a favor de energia elétrica, e posicionar-se como fornecedor deste tipo de energia. Embora não abandone os combustíveis fósseis, é um claro sinal de que mais do que continuarem a ser empresas de petróleo e gás natural, são empresas de energia, e como tal capazes de se adaptar às exigências societais e ambientais. De resto, já havia sido notícia a aposta de algumas empresas da indústria química norte-americana, Dow Chemical e Jonhson & Johnson em energias renováveis, independentemente da liderança política nos EUA.
Empresas como a Dow Chemical e Jonhson & Johnson
fizeram grandes apostas em energia renovável
Curiosamente, a exibição do referido documentário em canal aberto acabou por coincidir com a ocorrência do furacão Harvey nos EUA, o qual provocou extensas e penosas inundações na região da costa do golfo dos EUA/México. A nível industrial, tal contratempo meteorológico não só levou ao trágico colapso da fábrica da Arkema, localizada em Crosby (Texas) devido à paragem do sistema de refrigeração; como também estagnou parcialmente a capacidade de produção da indústria química dos EUA: a produção de etileno foi interrompida em 61%, a de polietileno em 51%, a de polipropileno em 65% e a de cloro em 33%. Tudo na janela temporal em que a tempestade e seus estragos ocuparam, seguindo-se o complexo rearranque das unidades que tiveram de ver a produção interrompida.
Fábrica da Arkema (Texas) após o furacão Harvey.
(REUTERS/Adrees Latif/File Photo)
Para aqueles que conhecem o tema, os efeitos do aquecimento global compreendem a subida do nível dos oceanos, e também o aumento de frequência e intensidade de vários fenómenos meteorológicos, entre outros. Assim, não deixa de ser caricato pensar que uma postura de autopreservação que pareça satisfazer os interesses económicos e industriais daqueles que mais poluem possa, a curto prazo, fazer backfire e revelar-se altamente contraproducente. Por exemplo, é sabido que o desmantelamento de poços de petróleo representa um elevado custo que empresa alguma estará interessada em incorrer. Porém, ignorar os sinais dos tempos representa em si mesmo riscos e custos:
- Quantos mais constrangimentos irá o aquecimento global provoca às próprias empresas de energia, que sabem estar particularmente expostos às zonas costeiras?
- Haverá vantagem em atrasar ou contrariar a migração societal do motor de combustão interna para o motor elétrico?
- Será mesmo possível ignorar que o aumento da população e a expectativas de estilo de de vida de todos os cidadão coloca pressão sobre o planeta, seja na indústria química ou noutra, e que portanto urge encontrar soluções melhoradas, mais do que preservar as existentes?
Estou em crer que a indústria e a engenharia química são parte da solução, e que só por distração é que se podem deixar ou fazer cair no papel de vilões da história.
(fundador e editor do BEQ)