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Sobre a competição entre motor eléctrico e motor de combustão interna em automóveis, e o reposicionamento da eng. química neste duelo



Pese embora os princípios e aplicações do motor eléctrico e da máquina a vapor sejam relativamente próximos quanto às respectivas datas de nascimento (1820 é a data da lei de Àmpere sobre conversão de energia eléctrica em mecânica, e 1781 a data da patente pioneira de James Watt protegendo a 1ª máquina a vapor), a decisiva inovação de Henry Ford por via do lançamento do pioneiro veículo automóvel de nome Ford T (corria o ano de 1908) partiu da premissa de que o combustível adequado para um veículo automóvel de transporte seria de natureza fóssil. O motor do Ford T funcionava a gasolina, querosene ou etanol.

Quiçá a engenharia química deva muito a este detalhe. Todo o século 20 marca uma era em que os combustíveis fósseis, com grande destaque para o petróleo, foram alvo de grande investigação e desenvolvimento. Paulatinamente as refinarias de petróleo tornaram-se o grande fornecedor das matérias-primas sobre as quais se foi edificando, ao longo dos anos, um intricada rede de produtos e processos, repleta de complexas interdependências e sinergias. Tudo isto em paralelo com o suprimento de combustíveis para os veículos automóveis.

E se durante o século XX o motor eléctrico parece nunca ter conseguido ombrear com o motor de combustão interna, o século XXI arrisca-se a marcar uma mudança significativa neste contexto. Os últimos anos têm sido marcados por lançamentos no mercado de veículos híbridos (motor eléctrico + motor combustão interna) e mais recentemente veículos 100% eléctricos. Atente-se aos números da figura abaixo, que relevam a recente erupção do mercado dos veículos eléctricos nos EUA, exibindo taxas de crescimento muito pronunciadas entre 2011 e 2013.


Vendas de carros eléctrico e híbridos em 2011-2013, nos EUA.


Do ponto de vista de engenharia química este crescimento do motor eléctrico em relação ao motor de combustão interna pode implicar mudanças paradigmáticas na área, dado que a energia eléctrica não é por excelência um campo técnico em que o engenheiro químico tenha grande apetência natural e dê o seu decisivo contributo.

Contudo, atente-se ao movimento recente da Toyota, cristalizado no lançamento (2015) para o mercado do veículo Toyota Mirai, que funcionará a hidrogénio. Por intermédio da reação química deste gás com o próprio oxigénio do ar, o carro será uma fábrica ambulante de energia eléctrica, por sua vez permitando a alimentação de um motor eléctrico, e a dispensa oficial do motor de combustão interna.


Toyota Mirai visto por baixo.


Assim, a proposta da Toyota (que é um fabricante de referência e que liderou o arranque da produção de automóveis híbridos) consegue a proeza de dispensar o motor de combustão interna mas não dispensar a engenharia química. Este novo veículo casa a engenharia química com a própria energia eléctrica de modo promissor. Note-se que o hidrogénio pode ser obtido da biomassa, de gás natural ou da própria água. Haverá desafios e oportunidades no fornecimento de hidrogénio em grande escala, e estes bem mais adequados à natureza técnica do engenharia química.

Tudo leva a crer que os próximos anos sejam marcados pela continuação deste processo de acomodação de energia eléctrica nos veículos automóveis. O papel da engenharia química será certamente reformulado em relação ao que tradicionalmente lhe competia. Contudo, mais do que uma dispensa de funções, o recente exemplo da Toyota permite fazer pensar que a engenharia química continuará a terá um palavra a dizer no fornecimento de matérias-primas vitais para que os veículos eléctricos circulem com autonomia.